quinta-feira, 21 de julho de 2011

A arte da estratégia...

Portugal deu novos mundos ao mundo. Mas desde que entrou para a UE tem-se esquecido de encontrar o seu. Hipnotizado pelo clube dos ricos da Europa, esqueceu-se de que a sua maior riqueza é a língua e a história.
fsobral@negocios.pt

E estas estão espalhada por África, pelas Américas, pela Ásia. É aí que, com a nossa pequena dimensão, as empresas se movem melhor. É onde as relações pessoais podem ser mais fortes. Para isso é preciso sentido estratégico. Algo que não existiu durante anos. Este é um momento histórico, porque é nos momentos de crise que se pode discernir melhor o horizonte de oportunidades.

Não podemos continuar a actuar tacticamente, escolhendo a Europa, a Espanha, o Brasil ou Angola segundo as conveniências de agenda política. O Estado português necessita de uma visão global estratégica.

É preciso dar sinais de que nada é feito por acaso. E é preciso perceber que hoje, neste contexto, não há países poderosos e menos poderosos. Todos têm poder. Têm é de entender que interesses comuns existem para escaparem aos apetites das grandes potências. Paulo Portas dá um sinal de grande inteligência política quando faz de Angola o seu primeiro destino oficial como ministro dos Negócios Estrangeiros, seguido da ida a Moçambique e ao Brasil. Está a dar um sinal. O tabuleiro estratégico de Portugal no futuro passa por aí. Esta Europa pouco tem a ver com o destino de Portugal.

E temos tudo a ver com o mundo onde a língua portuguesa, com mais ou menos acordo ortográfico, abre janelas comuns. Portugal tem de se definir em vez de andar a patinar na maionese europeia. Estratégia é isso.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Tópicos as palavras que fazem as notícias do mundo...

1. Economia brasileira em samba rápido

O presidente do Banco Central brasileiro veio ontem tranquilizar o mais possível os investidores e os observadores internacionais que incluem o Brasil entre os países com economias em maior risco de sobreaquecimento. Alexandre Tombini informou que a inflação já está a recuar, prevendo que em 2012 esteja dentro do objetivo ideal, e sublinhou que a economia brasileira cresce a uma velocidade convergente para a taxa sustentável de longo prazo.

Segundo Tombini, o Brasil está mais preparado para lidar com um cenário de crise que eventualmente se coloque. Boas notícias para os segmentos pobres da população: a economia brasileira continuará a crescer em ritmo de samba rápido nos próximos anos, provocando a dilatação da classe média.

E isto com um crescimento demográfico que também acelerou, assim se mantendo nos próximos 20 anos. Um alerta às empresas brasileiras: o risco cambial permanece, sendo que o dólar não estará a descer para sempre.

2. Christine Lagarde


A primeira mulher a comandar as finanças planetárias já iniciou  funções. O salário de Christine Lagarde foi fixado em cerca de 380.000 euros anuais, despesas incluídas. Uma atualização a rondar a inflação. Mas o contrato diferencia-se ao nível da maior exigência ética. O empregador espera que "sejam observados os mais altos níveis de conduta ética, consistente com os valores da integridade, imparcialidade e discreção".

3.
Bombardier

A construtora ferroviária canadiana prepara um despedimento em massa no Reino Unido: mais de 1.400 trabalhadores serão dispensados, cerca de metade do total naquele país. A razão apontada pela Bombardier prende-se com ter perdido um grande contrato público para uma rival alemã. São menos 3.000 milhões de euros. Preocupados, os sindicatos acusaram o Governo britânico de "vandalismo industrial".

A sensação de estagnar....

Apesar da série de acontecimentos de baixa probabilidade e de alto impacto que atingiram a economia global em 2011, os mercados financeiros continuaram a subir alegremente até há cerca de um mês.
O ano começou com o aumento dos preços dos alimentos, do petróleo e das matérias-primas, dando origem ao espectro da inflação elevada. Em seguida, desencadearam-se fortes tumultos no Médio Oriente, o que fez subir ainda mais as cotações do crude. Depois veio o terrível sismo no Japão, que provocou graves danos à sua economia e às cadeias de fornecimento global. E depois a Grécia, Irlanda e Portugal perderam o acesso aos mercados da dívida, pedindo ajuda financeira externa ao Fundo Monetário Internacional e à União Europeia.

Mas as coisas não se ficaram por aqui. Apesar de a Grécia ter sido resgatada há um ano, o Plano A falhou claramente. A Grécia vai solicitar mais um resgate oficial - ou uma ajuda por parte dos credores privados, uma opção que está a alimentar fortes desacordos entre os decisores políticos europeus.

Nos últimos tempos, os receios em torno dos insustentáveis défices orçamentais dos EUA também resultaram em querelas políticas, quase levando a uma crise governamental. Uma guerra semelhante está agora a fermentar em torno do "tecto de endividamento" da América, que, se não for resolvido, coloca a dívida pública norte-americana sob a ameaça de incumprimento "técnico".

Até há bem pouco tempo, os mercados pareciam estar a descontar estes choques; exceptuando alguns dias em que o pânico em torno do Japão ou do Médio Oriente levou a correcções, eles continuaram a subir. No entanto, desde finais de Abril, registou-se uma correcção mais persistente nos mercados accionistas globais, decorrente dos receios de que o crescimento económico nos Estados Unidos e no resto do mundo possa estar a desacelerar fortemente.

Os dados provenientes dos EUA, do Reino Unido, da periferia da Zona Euro, do Japão e mesmo das economias dos mercados emergentes estão a sinalizar que parte da economia global - especialmente no que diz respeito às economias avançadas - pode estar a estagnar, se não mesmo a mergulhar numa nova recessão. A aversão mundial ao risco também aumentou, à medida que a opção de "prolongar e fingir" ou "adiar e rezar" no que respeita à Grécia está a tornar-se cada vez menos desejável, com o espectro de uma reestruturação desordenada da dívida a tornar-se mais provável.

Os optimistas dizem que a economia global está simplesmente a passar por um período de abrandamento passageiro. As empresas e os consumidores reagiram aos choques deste ano através de uma desaceleração "temporária" do consumo, dos gastos de capital e da criação de empregos. Desde que os choques não piorem (e desde que alguns percam intensidade), a confiança e o crescimento retomarão na segunda metade do ano e os mercados accionistas voltarão a ganhar terreno.

No entanto, existem boas razões para acreditarmos que estamos a passar por uma contracção mais persistente. Em primeiro lugar, os problemas da periferia da Zona Euro são, em alguns casos, problemas de real insolvência, não de falta de liquidez: dívidas e défices públicos e privados enormes e crescentes; sistemas financeiros penalizados que precisam de ser saneados e recapitalizados; ausência de crescimento económico; e aumento do desemprego. Já não é possível negar que as dívidas públicas e/ou privadas na Grécia, Irlanda e Portugal precisam de ser reestruturadas.

Em segundo lugar, os factores que estão a levar a uma desaceleração do crescimento nos EUA são crónicos. Entre eles, incluem-se a lenta mas persistente desalavancagem dos sectores público e privado; o aumento dos preços do petróleo; a fraca criação de empregos; uma nova contracção no mercado imobiliário; graves problemas orçamentais a nível estatual e local; e um insustentável défice e encargo da dívida a nível federal.

Em terceiro lugar, no Reino Unido, o crescimento económico médio estancou nos últimos dois trimestres, com uma investida da austeridade orçamental numa altura em que o aumento da inflação está a impedir que o Banco de Inglaterra flexibilize a política monetária. Com efeito, a inflação poderá até obrigar o banco central inglês a aumentar as taxas de juro no Outono. E o Japão está já a resvalar de novo para a recessão devido ao sismo.

Todas estas economias estavam já a crescer de forma anémica e abaixo da tendência, uma vez que o processo de desalavancagem em curso exigia uma redução dos gastos públicos e privados, de modo a aumentar as taxas de poupança e a reduzir os níveis de endividamento. E agora, além da série de acontecimentos "cisne negro" com que as economias avançadas se confrontaram este ano, os estímulos monetários e orçamentais foram retirados na maioria delas, ou sê-lo-ão em breve.

Se o que está a acontecer acabar por se revelar pior do que um abrandamento temporário, a correcção do mercado irá continuar, debilitando ainda mais o crescimento à medida que os efeitos negativos - sobre a riqueza - da queda dos mercados de capitais forem reduzindo os gastos privados. E ao contrário do que aconteceu no período de 2007-2010, em que cada choque negativo e contracção do mercado foi sendo contrabalançado por mais medidas políticas por parte dos governos, desta vez os decisores estão a ficar sem munições, pelo que podem revelar-se incapazes de relançar os preços dos activos e de pôr em marcha a economia real.

Esta falta de armas políticas reflete-se no facto de a maioria das economias avançadas estar a implementar alguma forma de austeridade, de modo a evitar uma catástrofe orçamental no futuro. A dívida pública já está elevada e muitas obrigações soberanas estão já em dificuldades, pelo que a capacidade de os governos salvarem os seus bancos através de mais resgates, garantias e delimitação de activos questionáveis está a ser severamente limitada. É possível que não haja uma nova ronda da chamada "quantitative easing" por parte das autoridades monetárias, uma vez que a inflação está a subir - se bem que lentamente - na maioria das economias avançadas.

Se os mais recentes dados económicos globais reflectem algo mais sério do que um abrandamento momentâneo, e se os mercados e as economias continuarem a abrandar, os decisores políticos poderão ver-se também de mãos vazias. Se isso acontecer, o risco de estagnação ou de recessão em forma de W aumentará fortemente em muitas economias avançadas.


Nouriel Roubini é professor de Economia na Stern School of Business, Universidade de Nova Iorque, é "chairman" da consultora global de macroeconomia Roubini Global Economics (www.roubini.com) e é co-autor do livro intitulado Crisis Economics: A Crash Course in the Future of Finance, cuja edição em capa mole foi recentemente publicada nos EUA e no Reino Unido.

© Project Syndicate, 2011.
www.project-syndicate.org
Tradução: Carla Pedro

You Bastards!

Pedro Santos Guerreiro
Choque. Escândalo. Lixo. Resignação? Não. Mas sim, lixo, somos lixo. Os mercados são um pagode, e nós as escamas dos seus despojos.
Isto não é uma reacção emotiva. Nem um dichote à humilhação. São os factos. Os argumentos. A Moody's não tem razão. A Moody's não tem o direito. A Moody's está-se nas tintas. A Moody's pôs-nos a render. E a Europa rendeu-se.

As causas da descida do "rating" de Portugal não fazem sentido. Factualmente. Houve um erro de cálculo gigantesco de Sócrates e Passos Coelho quando atiraram o Governo ao chão sem cuidar de uma solução à irlandesa. Aqui escrevi nesse dia que esta era "a crise política mais estúpida de sempre". Foi. Levámos uma caterva de cortes de "rating" que nos puseram à beira do lixo. Mas depois tudo mudou. Mudou o Governo, veio uma maioria estável, um empréstimo de 78 mil milhões, um plano da troika, um Governo comprometido, um primeiro-ministro obcecado em cumprir. Custe o que custar. Doa o que doer. Nem uma semana nos deram: somos lixo.

As causas do corte do "rating" não fazem sentido: a dificuldade de reduzir o défice, a necessidade de mais dinheiro e a dificuldade de regressar aos mercados em 2013 estão a ser atacadas pelo Governo. Pelo País. Este corte de "rating" não diagnostica, precipita essas condenações. Portugal até está fora dos mercados, merecia tempo para descolar da Grécia. Seis meses, um ano.

Só que não é uma questão de tempo, é uma questão de lucro, é uma guerra de poder. Esta decisão tem consequências graves e imediatas. Não apenas porque o Estado fica mais longe de regressar aos mercados. Mas porque muitos investidores venderão muitos activos portugueses. Porque é preciso reforçar colaterais das nossas dívidas. Porque hoje todos os nossos activos se desvalorizam. As nossas empresas, bancos, tudo hoje vale menos que ontem. Numa altura de privatizações. De testes de "stress". Já dei para o peditório da ingenuidade: não há coincidências. Hoje milhares de investidores que andaram a "shortar" acções e dívidas portuguesas estão ricos. Comprar as EDP e REN será mais barato. Não estamos em saldos, estamos a ser saldados. Salteados.

Portugal foi um indómito louco, atirou-se para um precipício, agarrou-se à corda que lhe atiraram. Está a trepar com todas as forças, lúcido e humilde como só alguém que se arruína fica lúcido e humilde. Veio a Moody's, cuspiu para o chão e disse: subir a corda é difícil - e portanto cortou a corda.

Tudo isto não é por causa de Portugal, é por causa da guerra entre os EUA e a Europa, é por causa dos lucros dos accionistas privados e nunca escrutinados das "rating". Há duas semanas, um monumental artigo da jornalista Cristina Ferreira no "Público" descreveu a corrosão. Outra jornalista, Myret Zaki, escreveu o notável livro "La fin du Dollar" que documenta o "sistema" de que se alimentam estas agências e da guerra dólar/euro que subjaz.

Ontem, Angela Merkel criticou o poderio das agências e prometeu-lhes guerra. Não foi preciso 24 horas para a resposta: o aviso da Standard & Poors de que a renovação das dívidas à Grécia será considerado "default" selectivo; a descida de "rating" da Moody's para Portugal.

Estamos a assistir a um embuste vitorioso e a União Europeia não é uma potência, é uma impotência. Quatro anos depois da crise que estas agências validaram, a Europa foi incapaz de produzir uma recomendação, uma ameaça, uma validação aos conflitos de interesse, uma agência de "rating" europeia. Que fez a China? Criou uma agência. Que diz essa agência? Que a dívida portuguesa é BBB+ (semelhante ao da canadiana DBRS: BBB High). Que a dívida americana já não é AAA. Os chineses têm poder e coragem, a Europa deixou-se pendurar na Loja dos Trezentos... dos americanos.

Anda a "troika" preocupada com a falta de concorrência em Portugal... E a concorrência ente as agências de "rating"? Há dois dias, Stuart Holland, que assinou o texto apoiado por Mário Soares e Jorge Sampaio por um "New Deal" europeu, disse a este jornal: é preciso ter os governos a governar em vez das agências de 'rating' a mandar.

Não queremos pena, queremos justiça. A Europa fica-se, não nos fiquemos nós. O Banco Central Europeu tem de se rebelar contra esta ditadura. Em Outubro, o relatório do Financial Stability Board, que era liderado por Mário Draghi, aconselhava os bancos e os bancos centrais a construírem modelos próprios para avaliarem a eligilibidade dos instrumentos financeiros por estes aceites e pôr termo ao automatismos das avaliações das agências de rating. Draghi vai ser o próximo presidente do BCE. Não precisa de acabar com as agências de "rating", precisa de levantar-se destas gatas.

Este corte de "rating" é grave. É uma decisão gratuita que nos sai muito cara. Portugal é o lixo da Europa. As agências de "rating" são os cangalheiros, ricos e eufóricos, de um sistema ridiculamente inexpugnável. As agências garantem que nada têm contra Portugal. Como dizia alguém, "isto não é pessoal, apenas negócios". Esse alguém era um padrinho da máfia.